
Novo governo, velhas questões – Edição: 15
Essa é uma republicação de um artigo da MBF Agribusiness. antigo mas não obsoleto.
Setor sucroenergético levará ao novo presidente demandas antigas, mas de importância vital para seu crescimento e consolidação
O atual presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, se tornou, ao longo de sua gestão, conhecido como “garoto-propaganda do etanol”. Isso porque Lula viajou aos quatro cantos do mundo, defendendo o biocombustível brasileiro e apresentando-o como uma solução inteligente para os problemas ambientais do planeta. Além da intensa divulgação, na atual administração, houve um maior financiamento às empresas do setor sucroenergético por parte dos bancos do governo e diversos projetos que ajudaram o segmento a recuperar sua credibilidade, do ponto de vista socioambiental. Leticia Toledo – Atualize MBF – Boletim do Agronegócio “Talvez o maior mérito do governo Lula tenha sido o de não ter atrapalhado o setor”, diz o jornalista Ronaldo Knack, editor do site Brasilagro, “mas é inegável que ele o apoiou criando a Embrapa Agroenergia e determinando que a Petrobras mudasse seu relacionamento – e comportamento – com o setor, incentivando a criação da Petrobras Biocombustíveis que já investe fortemente na produção de etanol e biodiesel.” Porém, mesmo com todo destaque que o etanol recebeu nas duas gestões do presidente Lula, há ainda muitos desafios que ficarão a cargo do próximo presidente. Entre eles, igualar o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), em todos os estados, além da reduzir a alíquota para um valor menor do que o pago por combustíveis derivados do petróleo, tal como a gasolina. De acordo com o documento “Proposta de políticas públicas para o setor sucroenergético”, escrito pela Unica (União da Indústria da Cana-de-Açúcar), o futuro governo também necessitará ser mais transparente quanto a formação de preços da gasolina. A entidade afirma que “a artificialidade dos preços da gasolina e a falta de previsibilidade impedem o desenvolvimento de competição no refino e nas importações do produto, trazendo insegurança aos investimentos no desenvolvimento de combustíveis automotivos renováveis, como o etanol e o biodiesel.” Outra questão que será demandada, mas que ainda precisa ser discutida, é o estabelecimento da cana-de-açúcar no PGPM (Programa de Garantia de Preço Mínimo), que já existe para outros produtos agrícolas. A inclusão da cana neste projeto ajudaria os agricultores, especialmente os do Norte-Nordeste, a evitar prejuízos severos.

Descontinuidade – A falta de um planejamento para a matriz energética, a longo prazo, é a principal reclamação do setor. Nenhum dos governos anteriores, nem mesmo o atual, foi capaz de criar um planejamento coerente. Apesar da defesa constante do etanol, o pré-sal passou a tomar a maior parte das atenções e a receber altas somas de dinheiro, indicando uma involução ao considerar as questões ambientais. Para o professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) e ex-coordenador do Polo Nacional de Biocombustíveis, Edgar Gomes Ferreira de Beauclair, “o próximo governo precisa resgatar a importância dos combustíveis renováveis em vez de ficar alardeando o que ainda não é real e que tem altos riscos ambientais (pré-sal)”. Os investimentos públicos no pré-sal reduziram as somas de dinheiro aplicadas na pesquisa para aprimorar a tecnologia existente e desenvolver, em larga escala, o etanol celulósico, que pode colocar o Brasil à frente, até mesmo dos EUA. “É preciso incentivar investimentos em CT&I (Centro de Tecnologia e Informação) do setor de biocombustíveis e energias renováveis, onde ainda temos uma posição de destaque internacional. Mas com as atenções voltadas ao pré-sal, parece que vivemos a era pós-etanol”, diz o professor Beauclair. Para ele, os “investimentos nos combustíveis de segunda e terceira geração, dependentes do domínio da tecnologia de hidrólise da celulose, podem dar um retorno muito superior que os investimentos em energia hidráulica na região da Amazônia, e com um passivo ambiental infinitamente menor”. A necessidade de pesquisa para alavancar a produção é ainda mais premente, já que as expectativas para exportação nos próximos dez anos são grandes. Espera-se que o país se torne o maior fornecedor mundial do produto, porém, hoje em dia, 75% da produção é usada para abastecer o mercado interno e a demanda continua crescendo. O desafio é aumentar as exportações sem prejudicar o mercado doméstico e sem elevar os preços a ponto de tornar-se o etanol menos atrativo, em termos financeiros, para a população. O presidente da Unica (União da Indústria da Cana-de-açúcar), Marcos Jank, disse durante o Fórum de Energia 2010, promovido pela revista Exame, que “as perspectivas para o setor são muito positivas, mas não estamos vendo um novo ciclo de crescimento ou o surgimento de novas usinas. Em parte, devido à crise financeira do ano passado, mas também pela falta de políticas públicas mais claras”, disse Jank. Aliás, a Unica afirma que é preciso definir um marco regulatório para os biocombustíveis, que garanta a sustentabilidade econômica deste produto. Uma comissão do Senado aprovou, em agosto deste ano, a apresentação de projeto de lei que dispõe sobre a política nacional para os biocombustíveis, que foi o resultado de sete audiências públicas realizadas este ano, coordenadas por um grupo de trabalho designado para elaborar um Marco Regulatório para o setor. Entre as propostas incorporadas ao projeto, está o incentivo a ações nacionais e internacionais de certificação dos biocombustíveis para o reconhecimento da sustentabilidade da produção. A Unica também defende a criação de políticas para o uso do etanol e biocombustíveis no transporte público. Há, atualmente, alguns poucos projetos sendo testados em São Paulo e Curitiba, que já vem apresentando resultados positivos, gerando economia e menos poluição. Para o setor, ainda faltam “linhas de crédito específicas para as usinas viabilizarem os trabalhos de estocagem e ampliação, e para a indústria de bens de capital poder atingir a liderança no mercado internacional”, comenta o diretor presidente do CeiseBR (Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroalcooleiro) e diretor titular da Diretoria Regional do CIESP Sertãozinho, Adézio José Marques.
Infraestrutura – Outro ponto importante, que não é exclusivo do setor sucroenergético, mas uma reivindicação de todos os segmentos, é a melhoria da infraestrutura de logística e a redução do custo do transporte. Os portos nacionais não conseguem dar conta do movimento de navios. Uma prova deste problema é o congestionamento visto nos portos para embarcar açúcar nos últimos meses. Investimentos privados têm colaborado para melhorar a situação, mas ainda não são suficientes. Falta transporte por linhas férreas e hidrovias, que seriam considerados modais baratos. Enquanto isso, o principal meio de transporte é o rodoviário, que além de caro, em sua maioria, oferece péssimas condições. Uma alternativa, que já está em processo de instalação, são os alcooldutos. Porém, o próximo governo precisará aumentar os incentivos a este tipo de transporte e levá-lo às mais diversas regiões do país, o que representará não só uma redução nos custos para importação, mas também no preço do biocombustível em regiões não produtoras. Para a Unica, é necessário prever em lei as regras para a instalação e operações de dutos para transporte de biocombustíveis ou de etanol, com “critérios para a autorização da atividade pela ANP; garantia de exclusividade pelo período de amortização do investimento; regras de garantia de acesso e de compartilhamento de espaço com outros serviços públicos e outras atividades exercidas pelo estado, inclusive por concessionárias”.
O grande desafio – Para o jornalista Ronaldo Knack, o maior desafio que o setor terá com o próximo governo é “destravar, de fato, as amarras que impedem e inviabilizam a cogeração de energia elétrica a partir do bagaço de cana”, visão compartilhada pelo professor da Esalq, Edgar Beauclair, que complementa: “não se pode mais ter uma capacidade instalada como a atual sem uso ou com leilões direcionados.” Knack afirma que, para resolver estes gargalos, é preciso que os usineiros, os fornecedores de cana e de bens de capital do setor atuem politicamente como cadeia produtiva.

Marques, do Ceise BR, complementa que entre as reivindicações que serão levadas ao próximo governo está “uma política que contemple a bioeletricidade, pois temos um estoque de energia que equivale a mais do que uma Itaipu, mas o governo ainda não priorizou a energia a partir da biomassa”. “A política de cogeração está atrasada e cheia de vícios e uma agência reguladora que, ou é incompetente ou é gerida de má-fé, e que precisa receber atenção especial ou mesmo uma forte intervenção do governo”, afirma o professor Beauclair. A Unica defende que o incentivo a bioeletricidade deve acontecer por meio de um programa sustentado de consumo, com a contratação de 10.000 MW em leilões específicos para a bioeletricidade até 2020, o que viabilizaria a oferta de 1.000 MW/ano. Outro ponto defendido pela instituição é a “definição do preço-teto em leilões, as diretrizes para o financiamento, o tratamento fiscal para a cadeia produtiva, além de uma solução definitiva para os encargos de conexão, principal entrave histórico do setor”. O que se percebe é que o setor sucroenergético cobrará importantes decisões de quem vencer a corrida presidencial de 2010, pois os próximos quatro anos serão de extrema importância para sua consolidação e crescimento. Porém, tais decisões não serão importantes somente para o setor, elas terão efeito na sociedade brasileira como um todo, já que refletirão, efetivamente, no bolso da população, nos resultados ambientais e socioeconômicos do país. Por essa razão, “esperamos que, seja quem for governar nosso país pense, única e exclusivamente, no bem do povo brasileiro e que sempre respeite os princípios básicos da ética, moral e civilidade”, define Adézio José Marques.

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